3 de agosto de 2009

Alimentos biológicos não oferecem benefícios para a saúde?

A Agência de Segurança Alimentar britânica (FSA - Food Standards Agency) encomendou à “London School of Hygiene and Tropical Medicine” um estudo de revisão da literatura científica sobre alimentos biológicos e convencionais com o intuito de comparar os níveis de nutrientes presentes nos dois tipos de alimento.

Os resultados desse estudo foram divulgados primeiramente pela BBC e largamente difundidos pela restante imprensa sem qualquer questionamento ou análise aprofundada, sob a conclusão taxativa “Os alimentos biológicos não oferecem benefícios para a saúde”.

Mesmo que este estudo tivesse absolutamente provado que os produtos biológicos não apresentam diferenças nutricionais relativamente aos alimentos convencionais, eles teriam no mínimo os mesmos benefícios nutritivos que os convencionais, e portanto, quanto muito poder-se-ia dizer que eles não teriam benefícios nutritivos acrescidos. Dizer que não têm quaisquer benefícios para a saúde é uma tentativa de manipulação da opinião pública para que desvalorize a agricultura biológica.

A revisão encomendada pela FSA analisou 55 estudos realizados num espaço de 50 anos. De fora deixou muitos mais que não se enquadravam nos critérios de selecção estabelecidos e considerados por algumas vozes críticas como tendenciosos. Muitas dúvidas têm também vindo a ser levantadas na comunidade científica quanto à validade dos resultados de estudos mais antigos, uma vez que só agora se começam a definir metodologias mais rigorosas que oferecem resultados comparativos válidos. É portanto necessário ser-se cauteloso na atribuição de valor de prova a um estudo como este.

A ciência é feita de inúmeros estudos que ao longo dos anos se contradizem entre si até que comece a surgir um consenso. Um estudo por si só, mesmo se de revisão de outros estudos, tem um valor relativo e deve ser visto num contexto mais amplo.
No caso da comparação entre produtos biológicos e convencionais, foram realizadas nos últimos anos outras revisões da literatura científica, incluindo uma de 2007 pela Comissão Europeia, concluindo exactamente o oposto da FSA. Graças a essas revisões e a toda uma gama de estudos recentes mais fiáveis - começou a formar-se um consenso de que os produtos biológicos apresentam de facto diferenças significativas positivas em termos nutricionais.

No passado Janeiro de 2009 a revista Sábado publicou um extenso dossier cheio de referências a alguns desses estudos e apresentando, alimento por alimento, as diferenças significativas em teores de nutrientes encontradas pelos diferentes investigadores que conduziram estudos científicos sobre este tema. É interessante que tendo sido recentemente detectados 97% mais flavonóides em tomates biológicos, o dobro da vitamina C em pimentos biológicos e mais 60% de ácidos gordos em carne biológica, o estudo encomendado pela FSA não tenha encontrado diferenças significativas.

Não é no entanto de estranhar, considerando que o governo britânico, nomeadamente através da FSA, tem já um longo historial de ataque e tentativa de descrédito da agricultura biológica. Nos últimos anos o governo britânico tudo tem feito para abrir o Reino Unido às culturas transgénicas e à agricultura industrializada no geral, mas tem encontrado uma forte resistência popular. O interesse pela agricultura biológica é muitíssimo forte no Reino Unido e as pessoas receiam a contaminação dos seus produtos e a perda irreversível deste modo de produção amigo das pessoas e do ambiente. Têm por isso sido feitas diversas tentativas de demover os consumidores da sua opção pelo biológico - mas sem sucesso, diga-se de passagem.

Falta referir que o próprio estudo da FSA refere que não se debruçou sobre os efeitos benéficos para a saúde da ausência de pesticidas, herbicidas, hormonas e outros químicos de síntese nos alimentos biológicos. Porém, mesmo na eventual ausência de níveis mais elevados de nutrientes nos produtos biológicos, esse facto só por si já acarreta inúmeros benefícios para a saúde dos consumidores, facto que foi convenientemente deixado de parte aquando da divulgação massiva deste estudo nos media.

Além disso a não contaminação do ambiente por esses mesmos produtos e o consequente efeito benéfico sobre os ecossistemas, contribuem grandemente para a melhoria da saúde pública. Outro benefício convenientemente não mencionado.

A agricultura biológica é muito mais do que um modo de produção de produtos de qualidade. A agricultura biológica nunca teve por objectivo produzir alimentos mais nutritivos, essa é apenas uma consequência positiva secundária. O objectivo da agricultura biológica é o de oferecer o máximo de benefícios para a saúde global do planeta, assim como sociais e económicos, com o mínimo de impacto negativo sobre as pessoas e o ambiente. Os consumidores sabem disso e continuam a apoiar crescentemente a agricultura biológica, independentemente das polémicas que são lançadas em torno do valor nutritivo dos seus alimentos. A escolha dos consumidores parte duma decisão informada sobre os benefícios globais da agricultura biológica e não é facilmente afectada por golpes de desinformação.

Para saber mais sobre este estudo e os benefícios da agricultura e alimentos biológicos:

- Informação da IFOAM sobre benefícios da agricultura biológica na saúde humana e teor nutricional nos alimentos biológicos

- Resposta da Soil Association ao relatório da FSA

- Resposta do Organic Centre ao relatório da FSA e revisão alternativa de estudos sobre alimentos biológicos

CONTACTOS

INTERBIO – ASSOCIAÇÃO INTERPROFISSIONAL PARA A AGRICULTURA BIOLÓGICA



Edifício INOVISA, Tapada da Ajuda, 1349-017 Lisboa, Portugal

Tel. 916576365 * E-mail: interbio.bio@gmail.com